TERRÁQUEOS
(Sandra)
Terráqueos somos nós.
Os que trucidam outras espécies e a própria também, porque não aprendemos a conviver sem batalhas por causa do “toma lá, dá cá aquela palha” que leva nações a arrasarem outras com “justificados” motivos, de ambos os lados, para matar e morrer por isso.
Não nos consideramos irracionais claro, mas o somos sempre que:
Violamos a maternidade sagrada de outras espécies, violentando e inseminando vacas de forma anti natural para que procriem os seus bebês, tão importantes para elas por motivos óbvios e para nós por motivos vis, mas que são separados, logo ao nascerem para virar o “baby bife”, aquela carne tenra e macia que degustamos estalando os beiços, enquanto suas mães continuarão seu purgatório de parir a vida inteira na via crucis de não poderem amar e cuidar dos filhos que carregaram e nutriram em seu ventre.
Aprisionamos ursas por anos a fio para extração da bile usada na Medicina Tradicional Asiática e quando concebem, seus filhotes são separadas aos gritos de suas mães, clamando por elas em vão, submetidos, estes pequeninos, à mesma maquiavélica tortura delas, clamando por ajuda sem que elas possam fazer nada por eles além de ouvi-los chorar de dor.
Experenciamos cobaias manipuladas à pretexto de salvar pessoas, dolorosa e prolongadamente em inoxidáveis mesas de laboratório, vestidos de impecável e puro branco, como anjos à serviço de demônios, invisíveis mas presentes.
Sob a alegação de perpetuar a tradição de liturgias macabras, dilaceram-se animais inocentes, sem piedade nos rituais pseudo religiosos permitidos pela Justiça humana, às vezes cega, surda e muda, com o fim da obtenção de aquisições indébitas e favores especiais das Entidades claramente avessas aos ditames do Bem e da Compaixão.
Matamos elefantes para roubar seu marfim, abandonando seus órfãos chorando sobre a carcaça de suas mães inermes com a frieza de profissionais do mal, impassíveis instrumentos de crueldade e sadismo.
Roubamos a pele dos animais como se isso fosse indispensável para conseguir nosso agasalho à custa da vida deles, muito mais importante do que a nossa vaidade e exibicionismo mascarados de frio.
Visitamos no Zôo os bichos “diferentes” para curtir sua tristeza entre grades como réus sem culpa, achando normal estarem ali sem liberdade, seqüestrados de um lar tão bonito como o nosso, apartados de seus bebês tão carentes e frágeis como os nossos, na selva em que habitavam livres e felizes, como apreciamos viver.
Nós os matamos para come-los, para nos vestir e calçar o couro deles, nos divertimos com suas performances nos circos, bailados aprendidos sob o estalar do chicote e aplicação de choques elétricos que a platéia não viu, para exibirem o que não foram nascidos para SER nem REALIZAR.
Enquanto isso, no mundo continuam nascendo religiões e seitas, aos montões, como se divindades estivessem a nosso serviço e conveniência, derramando benesses e favores imerecidos sobre cabeças sem razão e corações sem sentimento.
Incensam-se pedidos nas velas acesas de milagres para mãos vazias de corpos preguiçosos que não semearam para colher os benefícios que querem atrair e os malefícios que querem afastar de suas vidas sem noção, enquanto a fumaça desenha na paisagem dos quintais e varandas as imagens de terror dos pedaços de animais esquartejados para o churrasco domingueiro onde parrudos chefes de família se empanturram, reclamando da barriga e do colesterol, fazendo piada junto de sua clã, entre risos e garfadas, nestas celebrações por tudo ou coisa nenhuma.
Terráqueos somos nós à espera de um Céu que não fazemos por merecer apesar de tantas preces, holocaustos, oferendas, penitências, simpósios, estudos e congressos porque nos julgamos os Bons que estamos longe de Ser por conta do trabalho que dá questionar tudo isso.
Impossível almejar ser escutados por Deus na qualidade de Seus Filhos, sem atender aos animais na condição de Nossos Irmãos.
Postulados enunciados nas tribunas importantes não nos habilitam a desprezar criaturas com o mesmo sagrado direito à vida de nossos amados pais e com a mesma abençoada esperança de nossos adorados filhos.
Terráqueos somos nós, os religiosos que se orgulham de expressar de cor seus dogmas incontestáveis, respondendo sem pestanejar à qualquer dúvida à respeito de sua Bíblia, Pentateuco ou Catecismo, mas fechando os olhos quando se trata de reconhecer nestes seres primitivos as lições vivas que são para os que já sabem ler, alfabetizados em Amor.
No entanto não estamos tão perto assim do Criador, como supomos, porque a fé com que O exaltamos oferece-Lhe as obras mortas dos animais que pereceram por nossa causa enquanto orávamos contritos por justiça e misericórdia para nós, ao Deus que os criou com o mesmo Amor – TAMBÉM.