Corria o ano de 1918. A gripe espanhola chegara ao Brasil de forma avassaladora. Na família constituída por pai, mãe e quatro filhos, todos adoeceram, com exceção de uma menina de cinco anos. Coube, então, a ela ir à farmácia comprar quinino, o remédio que se usava à época no combate à doença. Sentindo-se importante, ia feliz, sem ter muita consciência da gravidade dos acontecimentos. Na volta, a mãe lhe pedia que administrasse o remédio a todos os acamados, no que era prontamente atendida. Naquela família, todos sobreviveram. Noventa anos depois, ela narrava esse fato, nos mínimos detalhes e sempre com um sorriso, afirmando: “Como eu me sentia importante!” A menina era a minha mãe, que se sentia importante por ser tão útil.
A pandemia do covid-19, que mudou nossos hábitos e está exigindo o isolamento social das famílias, vem acarretando sentimentos e emoções inusitadas em milhares de pessoas, especialmente em crianças e jovens. A ansiedade e o medo afloram em toda parte e nos leva a refletir sobre possíveis recursos para enfrentá-la.
O primeiro deles deveria ser buscar Deus por meio da oração, confiando em Seus desígnios. É Ele quem comanda nossas vidas e todas as ocorrências no Universo. Muito provavelmente, quando reencarnamos sabíamos que quase todos nós que nos encontramos hoje, na Terra, passaríamos por essa situação difícil e plena de incertezas. Apesar do nosso espanto, mensageiros do Além há muito vinham nos alertando para o fato, fazendo-nos compreender que, embora dura, essa seria uma experiência que nos faria melhores, como humanidade. Encontrar no íntimo do próprio ser essa confiança inabalável no Pai de amor e bondade pacifica a alma.
Estabelecida essa confiança, é preciso que se entenda o que provoca a ansiedade e o medo. Os estudiosas da psicologia afirmam que ambos são decorrentes da falta de controle e de previsibilidade das situações em que estamos envolvidos, duas condições que marcam a atual pandemia. “Até quando ficaremos reclusos?” “Será que eu ou alguém da minha família irá se infectar ou morrer?” “Financeiramente, o que irá nos suceder?” Perguntas como essas são naturais na hora presente. E não há resposta para nenhuma delas.
Informação segura e em volume adequado podem ajudar a diminuir aqueles sentimentos. Saber o que está a seu alcance, como os cuidados de higiene e tudo aquilo que leva à prevenção é algo que se pode controlar. E não se deixar encharcar de más notícias, procurando, ao contrário, manter-se suficientemente informado, tentando ocupar a mente com coisas positivas – uma boa leitura, bons filmes ou séries, aquisição de novas habilidades, utilização dos recursos midiáticos para se manter em contato com amigos – são meios de amenizar as angústias e o sofrimento – ao lado das preces. Ao nos conectarmos com a espiritualidade superior haurimos força, ganhamos confiança e pacificamos nossos corações e mentes.
Em relação às crianças e aos jovens, entendemos que ficar impedido de estar com os amigos, realizar suas atividades fora de casa, quebrar por completo a rotina pode ser algo muito frustrante. Se ao sentimento de frustração se somar a obrigação de submeter-se a práticas completamente diferentes das usuais, de processos de ensino, não há como não se sentir aborrecido, com raras exceções.
No entanto, a ocasião é extremamente propícia para ajudá-los a cultivar atitudes que colaborem. É de suma importância fazê-los ver que, por trás dos número de mortes, há milhões de famílias enlutadas, com muita dor e sofrimento; que equipes atuando tanto na área da saúde, dos serviços básicos ou essenciais estão se submetendo ao contágio; que financeiramente milhares de pessoas em todo o mundo estão lutando para ter o que comer. Fazê-los refletir sobre isso é forma de despertar a empatia e a compaixão.
Criar espaços dentro de casa para atividades criativas, estabelecer conversas que permitam a cada membro da família conhecer um pouco mais sobre o que vai na intimidade de cada um, exercitando o amor, a compreensão, a paciência, é outra maneira de se engrandecer durante esse período de reclusão.
Mas talvez o mais importante de tudo isso seja fazer algo em prol do próximo, a começar pelo próprio lar. O isolamento social vem trazendo uma sobrecarga de afazeres domésticos. Aproveitar a ocasião para dividir as tarefas entre todos os membros da família, fazer-se útil, cooperar, também pode trazer consequências bem salutares. As neurociências afirmam que fazer o bem faz bem à própria pessoa; que emoções de alegria estão relacionadas com o aumento da capacidade de encontrar soluções criativas para os problemas, enquanto a tristeza embota o cérebro.
Queira Deus que esses dias nos façam criaturas melhores do que somos.