
Venho de uma família numerosa. Somos sete irmãos. Agora, quando nossos cabelos embranquecem, estamos vivendo um momento extremamente prazeroso: o de ver multiplicar-se, rapidamente, o número de netos e sobrinhos-netos. Chegam em levas de três ou quatro por ano. Como temos o hábito de cultivar os laços de afeto, eles vão sendo incorporado ao clã iniciado com os meus pais, trazendo-nos grandes alegrias. Percebo o carinho e os cuidados dos pais e guardo a confiança de que eles saberão proporcionar aos seus filhos uma boa educação, ajudando-os a se tornarem pessoas dignas e decentes. Alguma coisa me diz que assim será. Talvez a nossa própria história de vida, marcada por valores éticos que herdamos dos nossos antepassados e que cultivamos com carinho.
Penso em tudo isso quando vejo destinos marcados desde cedo por carência de amor e de cuidados. Filhos que crescem ao Deus dará, sem a mão amiga dos pais a lhes guiar pelas sendas do bem.
Registra-se, na atualidade, uma injunção bastante complexa de fatores que podem induzir ao erro mentes mal preparadas, afastando-as do caminho reto e seguro. Desigualdades sociais, famílias desestruturadas, pais ausentes, descuido na educação, valores morais precários aliados a um forte apelo à cultura das aparências, ao individualismo e à busca desenfreada pelo prazer– marcas do nosso tempo – favorecem comportamentos delituosos da juventude.
Quando as manchetes dos jornais estampam notícias sobre jovens delinquentes, busco compreender o que os levaram à criminalidade antes mesmo de atingirem a maioridade.
A Doutrina Espírita nos ensina que todas as almas nascem iguais, com aptidão para progredir, em virtude do seu livre-arbítrio; que todas são da mesma natureza e só há entre elas a diferença do progresso realizado.
Se nos detivermos na última parte dessa afirmativa, encontraremos explicação para o fato de haver tantos jovens manifestando tendências destrutivas desde muito cedo: são almas que ainda não realizaram o progresso a que estão destinadas. Errar é inerente ao estágio evolutivo em que se encontram.
No entanto, resta-nos a questão do livre-arbítrio. É ainda o Espiritismo que esclarece residir na consciência de cada individualidade a noção do certo e do errado. Mas, se progredimos diferentemente uns dos outros, temos, naturalmente, níveis distintos de consciência, conforme o tipo e o montante de ensinamentos que já conseguimos adquirir. E é principalmente o conhecimento das leis divinas, transformado em sabedoria, que irá determinar nosso grau de responsabilidade por nossas escolhas.
Corrobora essa relação entre conhecimento e responsabilidade a assertiva do Mestre Jesus exposta na parábola do mordomo infiel (Lucas 12:48): “àquele a quem muito foi dado, muito lhe será exigido”. Refletindo a seu respeito, costumamos enfatizar apenas o que trata da responsabilidade que recai sobre aquele que muito recebeu. No entanto, não podemos nos esquecer de que a frase começa com “a quem muito foi dado”, o que nos leva a concluir que algo foi dado e que essa doação não se fez de forma equânime (Também a parábola dos talentos nos remete a esta mesma ideia).
Quando Jesus trata da distribuição de prêmios e castigos na parábola do mordomo infiel, ele se reporta ao conhecimento anterior que o administrador já detinha. No caso, ele sabia como deveria agir. Ou seja, já havia feito essa aprendizagem, não tinha mais dúvida sobre como proceder corretamente.
Se responsabilidade está atrelada a conhecimento,quando se trata de questões morais, esse conhecimento deveria ser fruto de uma educação moral.
Assim, por esta linha de raciocínio, quer me parecer que a questão da responsabilidade diminui para os jovens que muito pouco ou nada receberam de seus pais em termos de cuidados, educação, conselhos e bons exemplos.
Creio que, com exceção dos espíritos muito adiantados, que já plasmaram na sua consciência a noção do certo e do errado, os que ainda se encontram nas fases iniciais ou intermediárias da jornada, arbitrar sobre o bem e o mal, decidir que rumos tomar quando se é ainda muito moço, não é tarefa fácil.
Se nós, individualmente, e as instituições sociais encarregadas da educação da criança continuarmos indiferentes à formação ético-moral da infância, teremos que conviver de maneira mais acentuada com jovens desnorteados, que desejosos de desfrutar de todas as facilidades e prazeres que a vida moderna disponibiliza, se enveredam pelo “ganho fácil”, confiantes na impunidade e na sua capacidade de não se deixar apanhar pelas malhas da lei.
Por mais batida que seja a solução, só há uma saída: a educação baseada em valores morais, ou como afirmava Kardec, a educação do caráter. Precisamos urgentemente estender nossas mãos às crianças a fim de ajudá-las a cumprir a destinação para a qual foram criadas: a perfeição espiritual.