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Artigo do Jornal: Jornal Agosto 2013

Sobre o autor

Lúcia Moysés

Lúcia Moysés

"O bem que praticas em qualquer lugar será teu advogado em toda parte." Emmanuel
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     Naquela manhã chuvosa foi difícil sair da cama para ir para o colégio. Minha mãe, como sempre, agasalhou-nos da melhor maneira e, cônscia da sua responsabilidade com a prole, nos despachou assim que a chuva deu uma trégua. Na época, eu cursava o antigo ginásio e estava com treze anos.

     Era mês de maio e em Cachoeiro de Itapemirim, nossa terra natal, durante esse período a igreja matriz se mantinha em festa, cultuando Maria Santíssima. A população local era predominantemente católica. Congregações confessionais, escolas e agremiações se revezavam nas homenagens à Mãe de Jesus. Desde menina, o ritual tocava profundamente a minha alma: flores eram depositadas ao pé do altar pelas crianças, enquanto suas vozes entoavam cânticos que ainda hoje trago na memória. No dia marcado, todos os integrantes das agremiações também eram incentivados a participar da chamada comunhão pascal.

     Então, naquele maio de 1958, os alunos do Liceu Muniz Freire – uma escola pública considerada a melhor da cidade – estavam se preparando para a sua Páscoa anual.

     A influência da igreja católica se fazia tão forte que, para tal, ela enviava um sacerdote à escola. Aulas eram suspensas; alunos levados para o salão principal e, a despeito da educação no País ser laica, professores e alunos eram obrigados a ouvir a preleção do pároco.

     O salão ficara pequeno para tanta gente. Tentando convencer a todos da importância de, pelo menos uma vez por ano, fazer a comunhão, o padre explicava que não fazê-lo era viver em pecado. E, a partir daí, comparava as delícias do Céu, reservadas para os puros, aos horrores do Inferno, destinados aos pecadores. Eu tremia de pavor, já que me imaginava em pecado.

     Talvez animado pela percepção do impacto que suas palavras causavam naqueles corações adolescentes, prosseguiu aprofundando detalhes até chegar ao dia do Juízo Final e à ressurreição dos mortos. Aí foi um Deus nos acuda! Sua figura imponente, por si só, já nos impunha medo. Ao afirmar que nesse dia o Criador iria decidir, definitivamente, quem deveria ir para o Céu e quem se destinaria ao Inferno, eu já estava decidida a virar santa. Prometia a mim mesma confessar, comungar e... nunca mais pecar.

     Chegando a casa, sentada à mesa do almoço, não falava em outra coisa. Estava apavorada com tudo o que ouvira.

     Minha mãe, apesar de ser espírita de berço, cedeu aos apelos da família do meu pai e nunca se opôs a que fôssemos levados por uma tia para a igreja católica. No entanto, jamais deixou de ser espírita. Era com naturalidade que comentava os fatos do cotidiano à luz do espiritismo. Por isso, depois de nos ouvir com atenção, falou-nos, com a maior segurança, sobre os temas que nos assustavam. Fecho os olhos e posso vê-la fazendo com as mãos um gesto de apinhamento, tentando nos convencer de que, considerando toda a população que já viveu na Terra, seria impossível haver lugar para o ressurgimento de tanta gente, no planeta.

     O alívio, no entanto, chegou de fato, quando usou toda uma argumentação lógica para nos falar da reencarnação. O medo foi substituído pela razão. Suas explicações faziam sentido e nos apontavam para a presença de um Deus bom e misericordioso, diferente daquele do Juízo Final. Sim, a morte, como aniquilamento total, não existe. A vida física que se extingue na Terra, continua plena e pujante no Além. Nossos amores não se perdem jamais. O Criador nos oferece sempre novas oportunidades de renascer em um corpo de carne porque é dessa forma que evoluímos espiritualmente. Explicação clara e convincente!

     Creio que foi ali, naquele momento, que comecei a me tornar espírita, embora ainda tivesse frequentado, por mais dez anos, as fileiras católicas, por hábito e comodismo.

     No entanto, as sementes plantadas estavam apenas esperando o tempo certo de brotar.

     Hoje, com a minha mãe já centenária, beijo-lhe as mãos e agradeço por me ter apresentado as luzes da Doutrina Espírita. São elas que permitem a mim e aos meus irmãos rodeá-la de cuidados e amor, na certeza de que somos eternos e que os laços que nos unem hoje nos acompanharão para sempre.

     A Sra. América Moraes Moysés, mãe da colunista, retornou à pátria espiritual no dia 23 último.

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