Às 6h do dia 4 de abril de 1971, desencarnou no Hospital do IASERG, a estimada consoror Eurídice Panar, diretora do Amparo Tereza Cristina, na Rua Magalhães Castro, 201 - na cidade do Rio de Janeiro.
Dona Eurídice nasceu na Praça 11, nesta cidade, aos 27 de abril de 1896, e era filha de Felipe Néri Pereira de Andrade e D. Emília Augusta de Souza Andrada.
Cursou a antiga Escola Normal do Distrito Federal, hoje Instituto de Educação, saindo professora na turma de 1916. Lecionou durante 30 anos em várias escolas do estado, salientando-se nas funções de Diretora Geral do Instituto Oswaldo Cruz, cargo em que se aposentou no ano de 1949. Achava o magistério divino e disse que, se tivesse de voltar à terra em outra encarnação, pediria a graça de ser professora outra vez.
De origem católica foi filha de Maria até a data de seu casamento, em 1920, com o jovem Eugênio Panar, de nacionalidade italiana. Viveu casada apenas oito anos, enviuvando em 1928, sem filhos. Eram grandes amigos e uma ternura inconfundível os unia pelos laços do amor puro e sincero. Sentiu muito a sua partida e não pensou mais em casamento, apesar de muito jovem ainda.
Logo após o casamento adoeceu gravemente e os médicos não conseguiram descobrir a sua doença. Percorreu várias Clínicas especializadas sem obter qualquer êxito. Uma amiga aconselhou-a procurar o médium Ignácio Bittencourt, então famoso pelas suas curas. Foi a ele e ficou surpresa com sua prescrição, dizendo-lhe que, para ficar boa, bastante seria freqüentar um Centro Espírita, estudar a Doutrina e desenvolver a sua mediunidade e tudo seria sanado. Voltou revoltada, pois era católica praticante se sentia muito bem em sua religião. Passaram-se os tempos e continuava nas mesmas condições, sem qualquer esperança de ficar boa. Ninguém conseguia acertar o diagnóstico de sua enfermidade. Nessa oportunidade uma grande amiga lhe emprestou um livro espírita intitulado "Um conselho de Maria para suas filhas", opúsculo editado em São Paulo. A leitura desse livro deixou-a abalada, pois, eram sublimes e lindas as mensagens. Logo em seguida a mesma amiga trouxe-lhe "Memórias do Padre Germano". Antes de terminar a sua leitura já estava freqüentando um Grupo particular, que funcionava na sede da União Espírita Suburbana, no Méier. Qual não foi a sua surpresa quando sem qualquer remédio, sua doença desapareceu como por encanto: Ignácio Bittencourt tinha razão!
Esse grupo era dirigido pela Irmã Saturnina Ramos de Carvalho, muito dedicada ao Evangelho e à Doutrina. Médium de raras qualidades era inspirada por Thereza Cristina, a Imperatriz do Brasil. Foi influenciada por esse boníssimo espírito a fundar uma Instituição de amparo a velhice, sob sua tutela espiritual. Reuniu todas as suas companheiras de trabalho, inclusive a nossa biografada, expondo a idéia - que foi aceita por unanimidade. Com enorme sacrifícios, conseguiram ajuntar dez contos de réis.
O amigo Assis Carneiro, vendo suas aflições, cedeu uma casinha em sua fazenda na Estação de Piedade, para que o Amparo pudesse ser iniciado. Graças a ele puderam instalar-se e iniciaram o trabalho com 15 vovozinhas naquele bairro distante. Apesar da boa vontade de todas, eram enormes os seus sacrifícios e as dificuldades que surgiam. Porém, não podiam parar pois o Abrigo já era uma realidade e não poderiam esmorecer.
Um dia apareceu uma casa à venda na Estação do Riachuelo, oferecendo todas as condições necessárias à Instalação do Amparo, que necessitava de reformas de ampliação. Apesar de bem localizada a casa custava uma fortuna - setenta contos de réis. Reuniram-se outra vez, oraram a Jesus, pediram inspiração aos amigos espirituais e começaram nova campanha intensiva por todos os meios e formas possíveis e com a ajuda de Deus, em pouco tempo foi adquirido o prédio onde funciona o Amparo Thereza Cristina, fundado em 1914 por onde já passaram mais de 500 vovozinhas.
Toda sua vida foi pontilhada de dores. Ficou cega por causa de uma catarata e apesar de diabética, mercê de Deus, foi operada com pleno êxito, voltando a enxergar. Teve problemas de coluna e dores cruciantes, às vezes prendendo-a ao leito por vários dias. Mesmo cega e doente suas companheiras não abriram mão de sua direção, fazendo-a permanecer no cargo de Diretora. Sentia-se muito feliz e grata a Deus, por ainda poder ser útil, apesar de doente e em idade avançada.
Dona Eurídice era de estatura mediana, 1,59, cútis clara, olhos e cabelos castanhos, já encanecidos, porém sempre bem tratados, muito elegante na sua simplicidade sem exageros. Dócil, meiga, delicada e de uma simpatia irradiante, figura exemplar de mulher missionária que dedicou toda sua mocidade até o último instante de sua vida terrena, à velhice desamparada. Era enérgica e tinha iniciativa, toda as abrigadas respeitavam e tinham-lhe verdadeira afeição. Resolvia todos os casos com energia e brandura, conquistando todos os corações.
Lembrava-se com muito carinho de todos os que de alguma forma colaboraram com o Amparo. Citando o Dr. Carlos Imbassahy, grande amigo da casa, conferencista oficial do Dia das Mães, hoje substituído por Dr. Orlando Sobreira Sampaio - a quem amava como um filho- , Azamor Serrão, também já na espiritualidade, o ceguinho amigo de todos os segundo domingo do mês, falando do Evangelho de Jesus às suas velhinhas. O querido vovô Vitorino, com sua meiguice e sua alma generosa, amigo de muitos anos, e, dizia ela, se fosse citar nomes, seria necessário uma enciclopédia, porque todos são tão bons e tão amigos, que meu fardo se torna leve, diante de tanta solidariedade e carinho. Não poderia esquecer minhas diletas companheiras, sem as quais nada poderia fazer.
Assim foi essa grande vida, alma boa e generosa que o Senhor chamou de volta ao Mundo maior. Por certo depois de merecido descanso, voltará a prestar os seus serviços em novas dimensões ao Amparo Thereza Cristina, que tanto amou e as suas companhias da retaguarda, integrando a equipe espiritual daquela casa abençoada, sob o olhar doce e complacente de Jesus.