Diz-se que cantor não ouve seus CDs, ator não vê seus filmes, palestrante não escuta suas palestras e escritor não lê seus livros. Posso imaginar que isso seja uma generalização, mas, independentemente de ser ou não real, como escritor releio o que escrevi, tanto nos momentos em que redijo um original, como quando faço as várias e necessárias revisões. E foi o que fiz recentemente em meu Reavaliando Verdades Distorcidas.
Tenho muito carinho por esse livro. Nele, embora que de forma bastante sintética, pude revisitar a obra inteira do grande Allan Kardec – sobre quem evito elencar as qualidades para não cometer o deslize de diminuir sua grandeza –, no intuito de resgatar o que de verdadeiro existe na conexão entre o Magnetismo e o Espiritismo.
Recentemente uma nova frase de efeito tem sido buscada para se dizer que o Magnetismo não deve ou não deveria ser considerado como matéria espírita. E isso seus defensores se fundamentam numa outra frase do próprio Allan Kardec (A Gênese, capítulo 1, item 55): “Caminhando de par com o progresso, o Espiritismo jamais será ultrapassado, porque, se novas descobertas lhe demonstrassem estar em erro acerca de um ponto qualquer, ele se modificaria nesse ponto. Se uma verdade nova se revelar, ele a aceitará”. Pois é baseado na frase acima que tem gente pedindo a retirada “até da palavra” Magnetismo da Doutrina Espírita, já que, argumentam, ele “Não foi provado cientificamente”. Então é de se perguntar: que tipo de provas o destronou? Que novas descobertas o substituiu? E que pontos foram ou deixaram de ser substituídos?
Analisemos a questão na sua totalidade.
O mesmo Allan Kardec também escreveu que (A Gênese, capítulo 1, item 16): “Assim como a Ciência propriamente dita tem por objeto o estudo das leis do princípio material, o objeto especial do Espiritismo é o conhecimento das leis do princípio espiritual. Ora, como este último princípio é uma das forças da Natureza, a reagir incessantemente sobre o princípio material e reciprocamente, segue-se que o conhecimento de um não pode estar completo sem o conhecimento do outro. O Espiritismo e a Ciência se completam reciprocamente; a Ciência, sem o Espiritismo, se acha na impossibilidade de explicar certos fenômenos só pelas leis da matéria...”. O que isto significa: que uma está contra a outra ou que se complementam? E como se complementariam se uma se armasse no dever de derrocar a outra? A mim me parece que ambas se complementam, mas que nem por isso deixam de ter seus limites de atuação. À Ciência material, a matéria; à Ciência Espírita, a alma, ou seja: o Espírito e sua união com a matéria. Resulta isso que, em dados limites, a matéria testa, confirma ou nega certos resultados físicos, ainda mesmo quando não saiba que meios a Natureza ou a alma humana mobilizou para sua realização ou no cometimento de falhas. Se assim não fosse, certamente teríamos que descartar o Espiritismo, já que essa Ciência material não reconhece o Espírito, os fenômenos espíritas, o Espiritismo como Ciência, a reencarnação etc.
Ainda em A Gênese (capítulo 1, item 40), ele escreveu: “O estudo das propriedades do perispírito, dos fluidos espirituais e dos atributos fisiológicos da alma abre novos horizontes à Ciência e dá a chave de uma multidão de fenômenos incompreendidos até então, por falta de conhecimento da lei que os rege – fenômenos negados pelo materialismo, por se prenderem à espiritualidade, e qualificados como milagres ou sortilégios por outras crenças. Tais são, entre muitos, os fenômenos da vista dupla, da visão a distância, do sonambulismo natural e artificial, dos efeitos psíquicos da catalepsia e da letargia, da presciência, dos pressentimentos, das aparições, das transfigurações, da transmissão do pensamento, da fascinação, das curas instantâneas, das obsessões e possessões etc.”. É certo que ao materialismo não pode ser dado o poder de decisão sobre assuntos que não lhes tocam às pesquisas apropriadas. E é também por isso mesmo que não se deveria jamais abrir mão dos aspectos científicos do Espiritismo, a fim de que com suas propriedades sejam observados os fenômenos competentes, deduzam-lhe as evidências, cataloguem os resultados e emitam juízo de valor para confirmar ou negar o que sob sua análise foi/for submetido.
Convenhamos: mesmo que o Magnetismo seja, como o é, elemento que pode muito bem ser também analisado pela Ciência comum, fica fora de questionamento a imperiosa necessidade de que sua análise leve em consideração valores que não são considerados por aquela e que, todavia, são capitais em suas conclusões.
Ainda no item 55 acima citado, Allan Kardec anotou: “O Espiritismo, pois, não estabelece como princípio absoluto senão o que se acha evidentemente demonstrado, ou o que ressalta logicamente da observação”. Pois bem; o Magnetismo está sim evidentemente demonstrado e tudo dele ressalta da lógica da observação. Quem o demonstrou? A própria Ciência Espírita, com seus meios e padrões de validação; e a observação dos infinitos resultados positivos oriundos da ação desse agente sutil, porém por demais vigoroso e real, chamado “fluido magnético ou fluido vital”.
Como você é uma pessoa atenta deve estar se perguntando: e o que tudo isso tem a ver com ele ter relido o Reavaliando Verdades Distorcidas? Vamos lá...
Há 10 anos, na página 166 daquele livro, escrevi: “Empolgante! Isso é empolgante! O Espiritismo já completou, neste ano de 2007, 150 anos de existência, mas ainda o temos novinho, inteiro, riquíssimo, bastando apenas buscar a obra de Kardec para ver quanta virgindade segue incólume por não termos sabido desfrutar-lhe as virtudes!”. E ainda hoje parece que seguimos à margem, pois não foi apenas o Magnetismo que deixamos (ou querem) deixar de lado, mas igualmente o sonambulismo, a dupla vista, o êxtase, a letargia, a catalepsia e tantas outras coisas preciosas, sem que lhe ofereçamos nada que substitua, complemente ou renove os postulados.
Muita ousadia atravessa a alma dos que sugerem a abolição do Magnetismo, tanto como muita acomodação ainda vigora em nosso meio, pois fazer Ciência Espírita é cientificar-se através dos estudos, da prática, das experimentações e, finalmente, da realização do bem, cheio de amor e sabedoria. E se alguém ainda continua contra tudo isso, melhor admitir que Allan Kardec deve ser descartado – o que seria o ápice do mal.