
Imaginemos um neófito que, após assistir a algumas palestras espíritas e receber os benefícios de um passe, resolva entender que Allan Kardec é mesmo o codificador do Espiritismo e que ele, seguramente, deve ter, em suas obras, as explicações e recomendações acerca do uso do passe.
Considerando que um bom número de espíritas tem a obra básica do Espiritismo em pdf – versão digitalizada para visualização em computadores e similares – e, por isso mesmo, pode fazer uma busca rápida em cima de verbetes, certamente irá digitar “passe” ou “passes”. Não será sem espanto que perceberá que o codificador quase não o usou e que, quando o fez, foi no sentido genérico de um movimento e não como resposta à inquietação que o levou a procurar o apoio do mestre.
Se, de alguma forma, tiver sido instruído a substituir o verbete “passe” por “magnetismo”, então surgirá uma grande dúvida: afinal, ele se referiu à ciência, chamada Magnetismo, ou à prática corriqueira de uma de suas formas?
Inexplicável! Sim; é inexplicável essa opção de grande parte das casas espíritas por não estar coerente com o codificador. Ele não orientou sobre passes, não recomendou passes e nem entronizou no chamado movimento espírita essa substituição de Magnetismo por passes. Ao contrário, sempre foi sua indicação de que os espíritas deveriam estudar e praticar o Magnetismo, extraindo dessa Ciência todo vigoroso potencial que ela tem a oferecer à humanidade inteira. E o que foi feito? Nenhuma obra clássica do Magnetismo foi traduzida para o Português, pelo menos há até 10 anos, quando então Paulo Henrique de Figueiredo publicou as obras de Mesmer no seu precioso e hoje esgotado Mesmer - A Ciência Negada e os Textos Escondidos.
E embora Allan Kardec, referindo-se ao incomparável barão du Potet, previu que a humanidade ainda lhe prestaria justas e relevantes homenagens; tendo chamado o magistral magnetizador francês Deleuze de “o sábio”; e ainda ter publicado mensagens de Mesmer -Espírito em sua Revista Espírita, a resistência à aplicação do Magnetismo segue sem qualquer propósito que seja louvável. Afinal, como é que se abre mão das possibilidades infinitas de se poder ajudar, efetivamente, aos que sofrem e, em seu lugar, se oferecer tão-somente um paliativo que tem-se mostrado de baixíssima eficiência?
A “desculpa” atual dá conta de algo surreal: “o Espiritismo não tem a missão de curar corpos”. Para simplificar, digamos que aceitamos o argumento. Aí surgem todas as inquietantes indagações: E onde fica a parábola do bom samaritano? E como entenderemos essa parte na missão de Jesus aqui na Terra? E o que faremos com O Evangelho Segundo o Espiritismo, quando nos coloca que devemos curar? E em que se sustentaria o “Fora da caridade não há salvação” se nos negamos a socorrer os doentes?
Jesus é nosso modelo e guia e Ele nos recomendou que fôssemos e curássemos. Allan Kardec é nossa base e foi dele a recomendação de que tenhamos o Espiritismo em seu tríplice aspecto, dentro dos quais estão a necessidade de avançar em ciência e filosofia também. Portanto, quem será que está querendo que sejamos espíritas sem Ciência? O que querem os que não querem que perguntemos, investiguemos, avancemos, enfim?
Imagino que a frase seja forte, mas... Como ser espírita sem Kardec? Apenas dizendo que frequenta ou dirige uma casa espírita? Como ser um pensador espírita se não está no apoio de suas teses a base kardequiana? Apenas reafirmando um frágil “sempre foi assim”?
Não ajuda muito simplesmente se aceitar práticas que não resolvem e esperar que um dia alguém faça aquilo que todos podemos realizar: um Espiritismo com E maiúsculo.