
Quando o sábio italiano Ernesto Bozzano, estudioso dos fenômenos psíquicos, foi convidado a participar do Congresso Espírita Internacional em Glasgow, Escócia, em 1937, e lhe foi proposta a questão Animismo ou Espiritismo, qual dos dois explica o conjunto dos fatos?, ele reuniu o material relativo aos seus mais de 40 anos de pesquisas sobre o assunto, formulando a magistral resposta:
Nem um nem outro logra, separadamente, explicar o conjunto dos fenômenos supranormais. Ambos são indispensáveis a tal fim e não podem separar-se, pois que são efeitos de uma causa única e esta causa é o espírito humano que, quando se manifesta, em momentos fugazes, durante a encarnação, determina os fenômenos anímicos e, quando se manifesta mediunicamente, durante a existência “desencarnada”, determina os fenômenos espiríticos. (Ernesto Bozzano, Animismo ou Espiritismo?)
Allan Kardec, desde o lançamento de O Livro dos Espíritos, em 1857, já sabia da possibilidade do Espírito encarnado, em determinadas circunstâncias, se revelar através de certos fenômenos, conhecidos pelos magnetizadores desde Mesmer no final do século XVIII como sonambulismo, dupla vista, telepatia, êxtase e outros, e que o Codificador da Doutrina Espírita classificou como fenômenos de emancipação da alma.
Quase um século depois, os estudiosos da ciência acadêmica ainda se debruçavam sobre esses fenômenos, com o intuito de fornecer-lhes outras explicações que não a existência da alma e sua manifestação. Kardec, tanto quanto Bozzano, sabiam através de uma vasta experiência que tanto há fenômenos espirituais realizados pelos encarnados quanto pelos desencarnados.
Se os cientistas sentem dificuldade em aceitar a explicação espirítica para os fenômenos que ocorrem por intermédio dos médiuns, há entre os espíritas dificuldade para reconhecer as ocorrências anímicas. Quando um sensitivo entra em estado de transe, quase automaticamente pensa-se num acontecimento mediúnico, desconsiderando-se a hipótese animista.
O sonambulismo magnético foi o precursor da mediunidade moderna, porém não desapareceu, continua coexistindo, dando mostras das potencialidades do Espírito, mesmo quando ainda preso ao corpo biológico. Enquanto em estado de vigília, a alma capta o mundo e se manifesta nele através dos sentidos físicos. Em estado de transe sonambúlico, os laços que a ligam à matéria se afrouxam, os sentidos se entorpecem e o Espírito como que se manifesta através do próprio corpo, desta vez vendo, ouvindo e percebendo através das suas próprias faculdades. Daí por que o sonâmbulo consegue enxergar algo que está distante, lembrar-se de vidas passadas e penetrar sua visão no futuro, ler os pensamentos do seu magnetizador, enxergar o interior dos corpos físicos, detalhar doenças...
Reduzida a atividade do corpo biológico através de uma ação magnética que facilita o desprendimento, percebe-se o estado de transe a que o corpo é submetido e o Espírito se sente à vontade para aproveitar da relativa liberdade alcançada naquele instante.
Aqui a alma se mostra a descoberto; não a percebeis, mas a vedes pensar e agir isoladamente do envoltório material; transporta-se para longe; vê e ouve, apesar do estado de insensibilidade dos órgãos. Pode-se explicar só pelos órgãos fenômenos que se passam fora de sua esfera de ação? E nisto não está a prova da independência da alma? Como, pois, não reconhecê-la por sinais tão evidentes? É que, para isto, seria preciso admitir a intervenção da alma nos fenômenos patológicos e fisiológicos, que, assim, deixariam de ser exclusivamente materiais. (Allan Kardec, Revista Espírita, janeiro de 1866)
Enquanto a mediunidade se faz instrumento para o estudo do Espírito desencarnado, através do sonambulismo, o Espírito encarnado se dá a conhecer. Por isso, Kardec afirmou ser o sonambulismo a prova da existência da alma. Mediunidade e sonambulismo, dois fenômenos que se assemelham, mas que são distintos, exigindo o primeiro a atuação de um Espírito desencarnado, enquanto que o segundo não necessariamente precisa da presença de alguém mais do que o próprio sonâmbulo desdobrado do seu corpo físico e expressando as faculdades que Deus lhe outorgou como Espírito que é.