
A visão popular exaltava ao presenciar as proezas do Galileu, debalde os que chacoteavam, outros tantos impressionavam-se com os movimentos que retornavam, os membros refeitos, as carnes que se reconstituíam ou ainda a multiplicação da matéria.
Tinha o corpo como alvo, contudo, o objetivo maior era o coração.
Entretanto, o fascínio popular maior advinha das ocasiões em que a instituição da morte, segundo se aparentava ao público, era vencida. Sem citar a ocasião da cruz, contudo, outros momentos em que o Mestre atendeu aos corações angustiados.
Lázaro, já partia de quatro dias dado como morto. Retornou ao convívio dos seus após o chamamento do Cristo; adentra o Mestre a casa de Jairo quando todos julgavam que o beijo da morte já haveria atingido a criança, os apegados ao condicionamento mental pessimista e agressivo, fixados na dor, já Lhe atiravam as faces o pretenso atraso, por apresentar-se quando já era tarde, o final já nos é conhecido.
Contudo, diferentemente, em Naim, Ele tem a iniciativa de dirigir-se a um coração materno esfacelado, tratava-se de viúva, a qual enterrava em cortejo fúnebre o único filho. O Mestre dá-nos, constantemente, as lições da compaixão, tão difíceis devidos aos automatismos humanos atuais. Vivemos enclausurados em nós e respectivos interesses, enquanto o Mestre está sempre voltado fora, nas necessidades em que pode ceifar. Interessante direcionamento mental do Mestre. Ele interrompe o enterro, chama o jovem, e faz questão de entregá-lo ao coração materno.
Vestem-se de grande prodígio tais acontecimentos, pois, pela dinâmica da existência, acreditamos ao vulgo, ser esta, a material, a vida real. Não recordamos o passado e não temos a ciência do futuro: “O vento sopra e não sabeis de onde vem e nem para onde vai” João 3:8. Some-se a isso, as décadas a fio na vida social, com objetivos efetivos. Forma-se, então, a convicção da vida na matéria como a única. Por isso, retornar alguém à vida corpórea era revestido de afirmação do poder maior, de vencer a própria morte, sem aperceber-se da verdadeira vida, objeto dos períodos na carne.
O desejo de muitos, justo, é claro, é, após a falência física, adentrar as cidades, ou se preferirem, as colônias espirituais.
Contudo, não nos parece simplista tal procedimento? É só desencarnar e ser levado à nova vida nestas ditas cidades?
Reflitamos, a literatura espírita já nos revela nos detalhes como é a vida em tais localidades. Quanto à alimentação: o alimento é necessidade da matéria. Contudo, sabemos ser deturpado no condicionamento mental, o qual se desdobra em vício e prazer fugaz para muitos. Portanto, marca-se no espírito, desdobrando como falsa necessidade para o pós-vida. Certamente, será necessária adaptação na promoção à nova vida.
Outras adaptações devem ser estimuladas, talvez até de forma mais intensa. No mundo do espírito, nas cidades espirituais, a disciplina impera como comportamento comum. Os trabalhos são incessantes. Nos mostra o livro Nosso Lar (Chico Xavier, psicografia de André Luiz), que governantes trabalham décadas a fio sem férias. A disciplina trabalha a indolência, a maledicência, a cólera, a raiva, a revolta etc. Todos partícipes da jornada atual. Adentrar as cidades espirituais necessita do preparo para tal benefício. É saber trabalhar mutuamente, ser parte sempre disposta ao auxílio, sem preocupar-se com possíveis antagonismos dos que divergem de nós.
A morte é apenas um portal, uma questão física. Contudo, o processo de descarga dos hábitos mundanos é revestido de adaptação de escala maior ou menor, conforme as decisões às quais nos entregamos. Com isso, percebemos que a transição entre os mundos se inicia na carne.
Irmãos, sem exceções, adentram os umbrais mais densos pela simples incapacidade de libertar-se dos hábitos do mundo físico. Precipitam-se nos prazeres sensoriais de todas as matizes, desequilíbrios e desarmonias de todas as espécies, fixações obsessivas compulsivas, melancolias severas ou, ainda, profunda incapacidade de lidar com o próximo.
Façamos presentes desde já os ensinamentos que nos credenciam a verdadeiros trabalhadores do Cristo, independentemente do mundo, físico ou espiritual.
Seja este o chamamento do Cristo a Lázaro, em nossas almas, façamos desta a respectiva estrada de Damasco. Levantemos os corpos inanimados do vício na direção da virtude e necessidades futuras. Esta é a mais importante de todas as transições.
Talvez tenha sido esta a mensagem do Cristo quando nos diz que tudo que desligarmos na Terra será desligado nos céus. Contudo, aquilo que ligarmos na Terra, da mesma forma, será ligado nos céus (Mateus 18:18).