
É comum ouvirmos dizer “ano novo: vida nova” e, partindo daí, novas aspirações, novos propósitos, novos projetos, expectativas reformuladas, esperanças renovadas.
Com muita propriedade, o ilustre Codificador afirma que a aspiração do homem para uma ordem de coisas melhor que a atual é um indício certo da possibilidade de que se chegará a ela (Allan Kardec – Obras Póstumas). Hoje, mais do que nunca, visto que a comunicação entre as criaturas, em todos os níveis e quadrantes, se alastra de forma estonteantemente rápida, essa afirmativa de Allan Kardec é da maior relevância porque o que o homem vivencia na atualidade física, e extrafísica também, não atende absolutamente aos seus melhores anseios, às suas aspirações por um mundo melhor, por uma vida mais tranquila, segura e harmoniosa, em todos os seus segmentos e condições humanas.
A humanidade, conturbada, explorada, exaurida física, mental, intelectual e espiritualmente, através de milênios, por reduzidos grupos investidos de poder temporal, parece ter chegado ao limite de sua capacidade de administrar o excesso de mal (LE q.784) gerado por tantos desatinos, arbitrariedades, abusos de pretensa autoridade, personalismos desvairados, tudo fruto da vaidade, do orgulho e do egoísmo de criaturas ainda em precário nível ético-moral.
A violência já foi exercida com todo tipo de propósito, inclusive em nome de Deus: guerras foram (e lamentavelmente ainda são) fomentadas para alimentar a indústria bélica de nações chamadas desenvolvidas – nações essas inclusive formadoras de guerrilheiros mercenários que hoje denominamos terroristas.
Entretanto, não vimos nenhuma dessas ações, na verdade desumanas, conduzir o mundo a uma situação de equilíbrio e os homens a viverem em paz e harmonia. Tanto Gandhi quanto Martin Luther King e ainda outros antes deles asseveravam que a paz só se conquista com meios pacíficos, jamais com a violência. E após tantas comoções e agitações terríveis, inerentes ao processo de transformação e de reformas em nosso presente estágio evolutivo, verificamos que nós, humanidade em geral, buscamos cada vez mais posturas e comportamentos que nos possam proporcionar soluções mais equilibradas e condições de vida e de desenvolvimento mais seguras e igualitárias.
Hoje, felizmente, já nos damos conta do quanto colaboramos com essa situação durante o longo caminho percorrido através dos tempos – até porque, espíritas que somos, temos em mãos o esclarecimento dado na pergunta 806 de LE, onde nos afirma a Espiritualidade que “a desigualdade das condições sociais não é uma lei natural – é obra do homem e não de Deus”.
Lembramos Allan Kardec, em seu comentário à questão 783 do LE: “O homem não pode permanecer perpetuamente na ignorância, porque deve chegar ao fim determinado pela Providência: ele se esclarece pela própria força das coisas. As revoluções morais, como as revoluções sociais, se infiltram pouco a pouco nas ideias, germinam ao longo dos séculos, e depois explodem subitamente, fazendo ruir o edifício carcomido do passado, que não se encontra mais de acordo com as necessidades novas e as novas aspirações”. E inúmeros edifícios do passado, antes considerados inexpugnáveis, intocáveis, acima de toda e qualquer lei, carcomidos que se encontram pela praga da ganância e do egoísmo, começam a ruir, também pouco a pouco, mas agora já de forma inevitável...
A força mesma das coisas, na expressão de Kardec, faz com que no momento certo a praga ela mesma se autodestrua, uma vez atacada pelos ventos da transformação e envolvida pela luz do conhecimento das leis universais, justas e sábias.
E é ainda Kardec, em seu comentário à questão 798, que nos esclarece de uma forma tão coerente e tão atual que pouco nos resta a dizer e muito nos cabe refletir a respeito: “As ideias não se transformam senão com o tempo, e não subitamente; elas se enfraquecem de geração em geração e acabam por desaparecer pouco a pouco com os que as professavam, e que são substituídos por outros indivíduos, imbuídos de novos princípios, como se verifica com as ideias políticas” – e não é o que estamos vendo acontecer, com movimentos maiores ou menores, inclusive em atitudes individuais, fomentando fraternidade e solidariedade nas mais diversas situações da humanidade?
Portanto, nesse novo ano, reafirmemos nossa confiança nos ensinamentos espiritistas que colocam com tanta transparência as leis naturais, justas e amorosas, as quais nos fornecem alicerces sólidos e bem estruturados para a construção de tempos novos, em que novas atitudes e melhores escolhas permitirão ao homem finalmente realizar suas aspirações de vivenciar a solidariedade e a reciprocidade necessárias ao estabelecimento de uma sociedade mais justa e mais feliz.
Fontes bibliográficas:
- Obras Póstumas – Kardec, Allan
- O Livro dos Espíritos – Kardec, Allan – pág. 784
- O Livro dos Espíritos – Kardec, Allan – pág. 806
- O Livro dos Espíritos – Kardec, Allan – pág. 783
- O Livro dos Espíritos – Kardec, Allan – pág. 798