Em Mateus 6:45 temos “O homem bom, do bom tesouro do seu coração tira o bem, e o homem mau, do mau tesouro do seu coração tira o mal, porque da abundância do seu coração fala a boca”. Portanto, segundo o Cristo, a boca é o termômetro da alma, transpira aquilo que lhe pertence ou sufoca. Externa a verdadeira propriedade do espírito, em pleno passo da caminhada evolutiva ou exaurido em aflições. Muitos de nós não percebemos, não nos damos conta do conteúdo predominante da nossa fala.
O caso é mais profundo e requer vigilância. Não se trata apenas de vigiar contra a maledicência, a “boa e velha fofoca”, mas de entendermos o que realmente sentimos, de identificarmos as raízes das nossas infelicidades. Vejamos, o ato de “fofocar” não denuncia apenas a falta de caridade para com o próximo, mas destaca fortemente as nossas respectivas frustrações perante a existência, as causas das nossas tristezas. Quando uma pessoa ocupa-se por demais com a vida alheia é por que não consegue encontrar graça, na forma de ocupação sadia que gera a alegria de viver, na respectiva existência. E não pensemos que a fofoca é uma metralhadora sem rumo, ela é direcionada justamente nos elementos interiores frustrados em nós.
Se a fonte da maledicência possui a decepção vinculada a profissão, este tentará denegrir ou diminuir o sucesso do próximo, dizendo que fulano assumiu o sucesso através de um emprego conseguido por vias escusas, em singular fenômeno invejoso “Assim até eu!”. Se a fonte da fofoca faceia as dificuldades domésticas, certamente atingirá a moral dos componentes do lar alheio, causando por vezes prejuízos e desconfianças na família vitimada pelos comentários maldosos. Se a frustração vem na capacidade intelectual, então certamente, aquele que demonstrar maiores recursos cognitivos, será alvo da crítica desleal e ofensiva. Porém, caso a fonte seja desequilibrada na área sexual, gerando em si a culpa resultante da falta do auto-amor, a fofoca ganhará o viés da interpretação sexual viciosa e, por vezes, totalmente desconectada da realidade. A maledicência nunca vem sozinha, a inveja é fiel companheira, instalada sob as bases da frustração e infelicidade.
Kardec, em nota comemorativa de 10 anos do lançamento do Livro dos Espíritos, citou de forma clara toda ação destrutiva da fofoca, quando amigos, acionados pela inveja ou destruídos pelos comentários perniciosos alheios, simplesmente se converteram em inimigos vorazes. Triste final para os que trouxeram na bagagem o compromisso perante a Doutrina. Alias, boa oportunidade para analisarmos a questão da maledicência dentro da Casa Espírita. Importante citar que o espírita, por vezes revestido do puritanismo, digo, da pureza a qual ainda não conquistou, critica o próximo, o irmão de jornada, de forma “educada”, exercendo a pseudo-caridade farisaica, repudiada pelo Cristo (Mateus 23:27:28).
Exercita a fofoca de forma velada, ardilosa, tendo no fundo o desejo de maldizer o companheiro de atividades. O interessante é que o espírita apegado ao puritanismo se diz crítico e não fofoqueiro, evidencia os erros do próximo para “auxilia-lo” na jornada, colocá-lo no “caminho correto”. Se a intenção é tão boa, porque “críticá-lo”, a terceiros? Por que não fazê-la diretamente, sem que ninguém mais saiba? Talvez porque a crítica direta e objetiva, sem deturpar fatos ou pre julgamentos, deixa de ser fofoca e passa a ser realmente crítica. Nesse caso, sob a visão do fofoqueiro, perde a graça.
Temos duas formas de combater a maledicência. A primeira é analisando as nossas palavras, fazendo uma “dieta das palavras”. Muitos adeptos do regime fazem uma “tabela de consumo” contendo todo alimento consumido durante o dia, controlando e medindo o que entra pela boca. Por que não fazermos uma “Dieta Inversa”, analisando o que sai da boca? Não é esta que deixa o homem impuro (Mateus 15:11)?. Ao termos o “mapa” das nossas palavras, teremos, então, uma ampla visão do conteúdo da nossa alma. Portanto, a boca é o termômetro. Através do mapeamento de nossas palavras, teremos o caminho aberto para identificarmos as nossas frustrações. Bem mais fácil combater as dificuldades do próximo. Menos penoso é tomar parte das frustrações alheias do que ocupar-se em corrigir as respectivas. Portanto, apelamos para fofoca por pura fraqueza.
A outra forma de combatermos a maledicência é não incentivando-a. Na posição de receptores poderemos melhor medir o quão destrutiva e desvirtuosa é a figura do maledicente ao denegrir a imagem do próximo, em detrimento das próprias frustrações. Naturalmente, o receptor da fofoca deve agir com caridade, fomentando a reflexão no agente, jamais alimentando a necessidade do companheiro em expor os erros do próximo.
A “dieta inversa” é uma bom início e balizador para os desafios da reforma íntima. Revelará as fontes das angústias, os fardos dos ombros (Mateus 11:30). Por outro lado, o tratamento de tais feridas da alma, junto ao processo de controle das palavras já nos aliviará parcialmente os sofrimentos íntimos, nos trará paz pela simples ação do combate aos nossos vícios. Entendamos que somos atingidos “por tabela” quando falamos de algo que nos infelicita, pois alimentamos intimamente a tristeza e a frustração por pura incapacidade de transmitirmos, a nós mesmos, a terapêutica para as respectivas almas combalidas.
A fofoca esta descrita em Mateus 15:11 mas esta perfeitamente conectada a passagem da trave e do argueiro (Mateus 7:13).