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Artigo do Jornal: Jornal Agosto 2020

Sobre o autor

Cláudio Conti

Cláudio Conti

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Muitos ensinos espíritas, quando comparados com acontecimentos da vida, incluindo os históricos, podem ser de difícil interpretação e entendimento. Isto ocorre em decorrência de uma tendência muito comum de analisar partes de informação isoladamente, sem combiná-las, seja conjuntamente ou sequencialmente. Dentre estes temas, o combate, ou as guerras, é um deles, o qual não parece de utilidade para a Providência Divina.

Kardec apresenta este conceito ao dizer que “a destruição recíproca dos seres vivos é, dentre as leis da Natureza, uma das que, à primeira vista, menos parecem conciliar-se com a bondade de Deus. Pergunta-se por que lhes criou ele a necessidade de mutuamente se destruírem, para se alimentarem uns à custa dos outros”[1].

Assim, para melhor entendimento da utilidade dos combates é preciso considerar a destruição dos seres vivos uns pelos outros, começando pela necessidade mais básica de todo ser vivo: a alimentação.

Tomemos como exemplo uma águia caçando um coelho. Nesta batalha, a águia utiliza todas as suas potencialidades para ter sucesso em seu intento. O coelho, por sua vez, utiliza todas as suas potencialidades para que ela não tenha sucesso em seu intento. Temos, então, que ambos, caçador e caçado, necessitam levar seus atributos ao extremo, pois, somente assim, serão capazes de se desenvolver. O fato de alcançarem os seus limites não significa que aquilo é tudo que podem aprender, podendo sempre ir um pouco além. Assim surgem os líderes, aqueles mais aptos e que sobrevivem aos outros.

Em um nível acima, nos primórdios da evolução, tem-se o humano caçando o coelho. Igualmente à águia, o humano necessita exercitar suas potencialidades, levando ao extremo para que, assim, possa se desenvolver. Sendo capaz de, mais tarde, com conhecimento mais depurado, produzir ferramentas para caçar animais maiores e, também, para se proteger de outros animais e das intempéries. Sendo caçador e presa, teve o humano oportunidade do desenvolvimento.

Desta forma, a evolução da inteligência humana segue seu curso, até que chega o momento em que, diante do que o humano já aprendeu, caça ou defesa, com relação aos animais, já não apresentam desafios suficientes para colocar os seus limites à prova. Diante deste quadro, apenas outro humano seria páreo para o humano, necessitando o embate entre lados opostos, isto é, os combates.

Se conseguimos enxergar espíritos desenvolvendo suas potencialidades, podemos melhor compreender o motivo pelo qual, durante uma batalha, há desencarnados assistindo aos combatentes e amparando cada um dos exércitos para estimular-lhes a coragem [2]. Além disso, também é viável que batalhas sejam previstas na Providência Divina, utilizando espíritos que ainda se comprazem com estes eventos, sem que creditem importância para justiça ou injustiça e, com isso, também exercitem seus próprios limites [3] .

Diante da desencarnação advinda dos embates, os espíritos que eram soldados têm reações diversas, dependendo, obviamente, de seus interesses pessoais. Assim, não é o fato da desencarnação em evento violento ou não, que afetará a condição do espírito que desencarna, mas, como já dito, seus interesses. Podendo, desta forma, tanto continuar a sua ação na batalha ou afastar-se, mantendo-se alheio à situação que já não mais pertence [4].

A lição que podemos tirar desta questão dos combates é que “para quem apenas vê a matéria e restringe à vida presente a sua visão, há de isso, com efeito, parecer uma imperfeição na obra divina. É que, em geral, os homens apreciam a perfeição de Deus do ponto de vista humano; medindo-lhe a sabedoria pelo juízo que dela formam, pensam que Deus não poderia fazer coisa melhor do que eles próprios fariam”[1]. Este ponto de vista deve ser aplicado nos vários eventos da vida como encarnado, lembrando sempre que a desencarnação nunca deve ser vista ou apresentada como expiação, pois se trata de um processo natural e válido para todos os encarnados.

Assim, todo divulgador espírita deve cuidar para não apresentar a desencarnação como uma forma de sofrimento ou como o “pior que pode acontecer”. O pior que pode acontecer ao espírito é ficar ligado à condição de encarnado quando já se encontra na condição de desencarnado, tal qual o combatente “morto" que permanece no campo de batalha.

Não haveria melhor forma de terminar este texto do que com as palavras de Kardec para nossa reflexão: “Não lhes permitindo a curta visão, de que dispõem, apreciar o conjunto, não compreendem que um bem real possa decorrer de um mal aparente”[1].

"Só o conhecimento do princípio espiritual, considerado em sua verdadeira essência, e o da grande lei de unidade, que constitui a harmonia da criação, pode dar ao homem a chave desse mistério e mostrar-lhe a sabedoria providencial e a harmonia, exatamente onde apenas vê uma anomalia e uma contradição”[1].

“A verdadeira vida, tanto do animal como do homem, não está no invólucro corporal, do mesmo modo que não está no vestuário. Está no princípio inteligente que preexiste e sobrevive ao corpo”[1].

“É necessária a luta para o desenvolvimento do espírito… O que ataca em busca do alimento e o que se defende para conservar a vida usam de habilidade e inteligência, aumentando, em consequência, suas forças intelectuais. Um dos dois sucumbe; mas, em realidade, que foi o que o mais forte ou o mais destro tirou ao mais fraco? A veste de carne, nada mais; o espírito, que não morreu, tomará outra”[1].

Notas bibliográficas:
1. Allan Kardec; A Gênese, Cap. III.
2. O Livro dos Espíritos, questão 541.
3. Ibidem; questão 542.
4. Ibidem; questão 546.

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