
O atual momento da experiência humana é, sem dúvida, marcado pelo medo, nervosismo, preocupação e ansiedade. Por todo lado que nos dirigimos encontramos pessoas temerosas de que algo terrível possa acontecer. Vive-se um verdadeiro malabarismo para manter-se ao menos confortável na própria vida.
Os momentos de alegria se transformaram em excessos de toda ordem, e a gratidão é apenas demonstrada nas efêmeras satisfações do ego; a escassez ronda e ameaça a existência humana. A atual realidade mundial aponta cada vez mais para o risco da escassez de alimentos, pois enquanto a população humana cresce aproximadamente 83 milhões por ano, os recursos agrícolas não são aproveitados em todo o seu potencial, ou seja, a escassez de alimentos é de fato uma realidade que pode nos alcançar em pouco menos de 50 anos. Mas, será que é realmente isso que nos preocupa?
“Portanto, não vos preocupeis com o dia de amanhã, pois o amanhã trará suas próprias preocupações. É suficiente o mal que cada dia traz em si mesmo1”.
Parece que a recomendação de Jesus não tem tido muito lugar na prática da vida moderna, na qual a ansiedade campeia e garante estada na vida do homem e da mulher que, por vezes, acreditam ter o controle da vida em suas mãos. E com todo o “poder” de quem muito pouco de si conhece, atropela-se e atropelam-se na vida.
“Portanto, vos afirmo: não andeis preocupados com a vossa própria vida, quanto ao que haveis de comer ou beber; nem pelo vosso corpo, quanto ao que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o alimento, e o corpo mais do que as roupas2?”
Por quantas vezes já deixamos de viver um momento de alegria ou mesmo de felicidade por temermos que logo depois algo terrível pudesse acontecer? Quantos dos nossos dias deixaram de ser aproveitados porque estávamos imaginando que algo horrível aconteceria e que perderíamos tudo o que acreditamos ter? Sem contar com a economia de sentimentos nobres e de demonstrações de afeto, tudo por medo de perder, só não se sabe o quê. Pode até parecer loucura, mas é exatamente assim que uma boa parte de nós está vivendo a vida.
Por que fazemos isso?
Nos permitimos ficar vulneráveis às interferências do mundo externo, com todas as suas informações e exigências, somos bombardeados a cada segundo com tudo o que acontece no mundo e o próprio cérebro com toda a sua engenhosa capacidade não consegue acompanhar, sofrendo exaustão. Estamos nos transformando na “Geração Superficial”, como afirma o jornalista e pesquisador norte-americano Nicholas Carr, olhamos por cima e tiramos conclusões sem aprofundamento. Mas, por que somos tão vulneráveis a tudo isso?
A resposta também se encontra no Evangelho:
“Qual de vós, por mais que se preocupe, pode acrescentar algum tempo à jornada da sua vida3?”
Quando mergulhamos fundo e dedicamos tempo à nossa jornada sabemos que sentimentos como a alegria e gratidão precisam fazer parte do nosso dia a dia. Eles são como a luz que nos guiará na escuridão do nosso ser. É verdade! Temos medo do escuro, e é justamente por termos esse medo que abrimos mão de sentirmos os melhores momentos da vida, de agradecer cada acontecimento, por mais simples que ele seja. Nesse momento tão torpe da experiência humana não podemos atrasar nossa caminhada, e mais que nunca a gratidão tem papel importante em nossas vidas, pois essa “filha do amadurecimento psicológico, enriquece de paz e de alegria todo aquele que a cultiva”, como afirma a Mentora Joanna de Ângelis4.
Precisamos compreender que a luz só pode ser definida pela experiência vivida no escuro do nosso ser, e sem um trabalho com a sombra seremos aqueles que passamos ansiosamente pela vida deixando apenas um leve rastro por medo de sujarmos os nossos pés.
1 Mateus 6:34
2 Mateus 6:25
3 Mateus 6:27
4 Psicologia da Gratidão