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Artigo do Jornal: Jornal Novembro 2014

Sobre o autor

Cláudio Sinoti

Cláudio Sinoti

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Sendo o amor a força mais sublime do Universo, por que será que ainda resistimos tanto à sua presença?

Nas experiências cotidianas, assim como nas observações do consultório terapêutico, não é raro encontrar pessoas que dizem desacreditar do amor, ou mesmo que desistiram de “investir nisso”, como se tratassem de algo que deva apresentar retorno imediato por parte dos outros. Alguns, quando se referem aos relacionamentos, dizem que criar vínculos não é algo prioritário em suas vidas. Sem julgar o caminho que cada um escolhe para si, é necessário avaliar se não se trata de uma defesa contra esse sentimento que nos invade, e que faz com que a mais forte razão se submeta a um poder superior. E justamente por isso, aqueles que desejam ter o controle de todas as coisas, temem “se perder”, e terminam por se perderem ao escolher “não amar”.

Na tentativa de desvelar a formação desse tipo de comportamento, verifica-se que muitas feridas emocionais provêm da infância, e por isso mesmo a psicologia moderna dedica tanta atenção à criança ferida. Esse termo não se refere somente às questões cronológicas da infância, mas especialmente à interpretação imatura das experiências que vivemos.

Nos estágios iniciais do desenvolvimento da personalidade, o aprendizado do amor coloca-se em primazia, pois é através dos vínculos construídos com os nossos pais ou substitutos que elaboramos modelos para nossos relacionamentos posteriores. Isso fica evidenciado pela condição de dependência que marca os estágios iniciais da nossa vinda ao mundo. A busca instintiva do seio materno, já nos primeiros momentos de vida, não é apenas para saciar nossa fome biológica, mas também emocional, pois confere segurança àquele que é acolhido e amamentado.

As bases afetivas do lar são essenciais ao desenvolvimento da autoestima, pois se a criança não se sente amada e acolhida pelos mais próximos, normalmente projetará nos relacionamentos externos toda a insegurança que vai sendo formada a partir das suas experiências iniciais. Se aqueles “heróis” a quem tanto admira não a amam, quem poderá amá-la? Essa dúvida pode ser o bastante para que se desenvolvam conflitos na expressão da afetividade.

Outros fatores interferem negativamente, pois não são raros casos de violência, abandono ou negligência em vários níveis, que vão acumulando marcas no comportamento, na forma de complexos perturbadores. Aquele que não recebeu amor de forma saudável tem mais chances de apresentar dificuldades em sua expressão.

Mas o que fazer quando as circunstâncias no lar foram difíceis, e deixaram em nós as marcas da criança ferida?

Periodicamente temos que revisitar os quartos trancados da própria existência, reelaborar questões dolorosas e difíceis, e nos libertar a partir da consciência e do amor. Costumo recordar que não podemos modificar as circunstâncias objetivas que vivemos, mas a nossa forma de ver a vida sempre pode ser transformada. Precisamos de novas lentes existenciais para libertar o amor que ficou prisioneiro. Isso é um gesto de autoamor, base para todas as transformações e conquistas interiores. A terapia do amor deve começar nessas bases, porquanto nem mesmo a caridade que se projeta para fora pode se sustentar se nós não temos um vínculo profundo conosco e com todas as questões que vivemos1.

Muitas vezes essa criança ferida necessitará compreender e perdoar aqueles que, tendo sido feridos, transferiram suas questões e amarguras para ela. E quando ampliamos o olhar da vida, trazendo para perto os olhos do espírito que somos, vemos que, de certa forma, somos todos vítimas e algozes, e que enquanto não haja um olhar consciente, esse ciclo vicioso perdura. A terapia do amor, que se inicia no autoamor e se dilata para todas as relações, é de suma importância para que essa libertação seja efetiva, porquanto como nos recorda Joanna de Ângelis:

“...é indispensável que se faça uma revisão desses conteúdos psicológicos, enfrentando com amor a própria infância não superada, a fim de diluir as fixações, mediante afirmações novas e visualizações afáveis, amorosas, que se sobreponham às de natureza perturbadora, crescendo, a pouco e pouco, na emoção, até atingir o amadurecimento que lhe correspon­da à idade real”2.

 

 


1 Vide Espelhos da alma: uma jornada terapêutica. Núcleo de Estudos Psicológicos Joanna de Ângelis. Leal Editora, 2014

2 Autodescobrimento: uma busca interior. Leal Editora, 1995

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